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Municípios que apoiam proposta terão material didático e cursos de formação
Com quantos anos uma criança precisa
saber ler e escrever? O Ministério da Educação lançará no mês que vem o
Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, que estabelece que
todos devem estar alfabetizados ao fim do 3.º ano do ensino fundamental,
aos 8 anos de idade. É o que prevê, também, a meta 5 do Plano Nacional
de Educação (PNE), em tramitação no Congresso.
No País todo, 5.182 municípios (93,2% do total) aderiram ao pacto e receberão material didático e cursos de formação docente.
Uma notícia a ser comemorada? Em parte,
afirmam os especialistas. O compromisso com a alfabetização é importante
e é preciso, de fato, que o País se responsabilize por isso. A questão a
ser discutida, questionam, é a idade estipulada para que esse processo
se concretize.
“Oito anos é muito tarde. O País já paga
muito caro pelo histórico de falta de atenção à educação. Então, se a
ideia é mudar isso, temos de centrar esforços e apostar em metas mais
ousadas”, afirma Izolda Cela de Arruda Coelho, secretária de Educação do
Ceará.
Por lá, os avanços dos anos iniciais
fizeram o Estado referência em alfabetização. O programa do MEC,
inclusive, foi inspirado no que é desenvolvido pela rede cearense desde
2007 (mais informações nesta página). “Recebemos a visita do ministério,
porque pediram nossa participação. Minha discordância manifesta é em
relação à idade”, completa Izolda.
Pode parecer detalhe, mas, nesse caso,
um ano a mais faz diferença no direito dessa criança de se apropriar das
coisas à sua volta, afirma o neurocientista Ivan Izquierdo, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “Prejuízo intelectual não
causa, porque sempre se pode alfabetizar depois. Mas a criança perde
espaço para participar do mundo.”
Para ele, essa alfabetização tardia é
uma questão cultural e mudar esse paradigma exige que as políticas
públicas considerem, além do olhar dos pedagogos, a visão de outros
cientistas. “Não dá para trabalhar isolado. O cérebro é uma questão da
neurociência. Aos 3 anos, a criança já tem condições de dominar e usar a
linguagem. Aos 6, já pode estar alfabetizado.”
O presidente do Instituto Alfa e Beto,
João Batista Araujo e Oliveira, explica que 6 anos é a idade em que se
alfabetiza na maior parte dos países que têm um idioma com complexidade
parecida à da língua portuguesa, considerada semitransparente, isto é,
que tem razoável correspondência entre grafema e fonema.
Há línguas transparentes em que a
correspondência é mais regular – como o italiano e o finlandês – e
idiomas opacos, nos quais há muitas irregularidades entre a forma que se
fala e a maneira que se escreve, como o inglês. Nesses idiomas, o
processo seria mais demorado.
“Considerando que a escolarização tem
começado aos 4 anos, não dá para conceber que se leve outros quatro para
que essa criança leia e escreva”, diz Araujo e Oliveira.
A prova da possibilidade dessa
alfabetização, resume a consultora educacional Ilona Becskeházy, são as
escolas privadas. “Se o aluno do colégio particular aprende a ler e a
escrever no primeiro ano, por que a expectativa para quem depende da
rede pública é maior?”
Ponderações. Apesar da capacidade
neurológica das crianças, trabalhar com idade limite inferior aos 8 anos
é utopia, pondera Priscila Fonseca da Cruz, diretora executiva da ONG
Todos pela Educação. “Uma meta precisa ser desafiadora, mas factível. É
claro que há muitos que lerão aos 6 e aos 7 anos, mas se conseguirmos
uma régua que garanta que ninguém chegue aos 9 analfabeto, já é um bom
início.”
Ela lembra que a Prova ABC – aplicada a
cerca de 6 mil alunos de escolas municipais, estaduais e particulares de
todas as capitais do País – mostrou que só metade dos estudantes estava
plenamente alfabetizada aos 8 anos.
É preciso, ainda, considerar que pelo
menos 20% das crianças brasileiras também não têm acesso à educação
infantil e chegam menos prontas ao ensino fundamental. “Infelizmente o
Brasil é desigual e o princípio da razoabilidade precisa estar
presente”, acrescenta Priscila.
O secretário de Educação Básica do MEC,
Cesar Callegari, também contesta a visão de que se deveria baixar para
os 6 anos a idade de alfabetização. “O que estamos propondo não se
trata, de forma alguma, de esticar um prazo. Nossas crianças vêm de
várias origens e a escola procura minimizar essa desigualdade”, diz.
Durante o ciclo de aprendizagem, que
engloba os três primeiros anos escolares, alguns alunos se desenvolverão
antes que outros. “Só devemos assegurar que todos, sem exceção,
terminem essa fase alfabetizados. Isso não é afrouxar o trabalho, é
respeitar que as crianças têm ritmos de desenvolvimento diferentes.”
Callegari acrescenta: “O que vamos medir ao fim dos 8 anos não é a pura
decodificação e a leitura automática. É algo mais complexo que, até
mesmo nas escolas particulares, se consegue apenas nessa idade.”
Autor: Estado de S. Paulo
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